Campeões de Mystra 01: Myrkul e a Coroa de Chifres

21 Kythorn, 1357 DR (Ano do Príncipe)

O Templo de Mystra em Deepingdale havia se preparado para receber uma visita ilustre: a aprendiz mais promissora de Vangerdahast, o Mago Real de Cormyr. A tarefa de buscar a jovem Caladnei na estalagem do vilarejo próximo cabia a três dos mais graduados sacerdotes do templo, Thommus Sparks, Steven Strand e Morganya Kerymnodel, enquanto Ragel Qamar preparava a biblioteca para recebê-la.

A feiticeira parecia estar realmente impressionada com a coleção de textos arcanos do templo, mas todos foram surpreendidos quando pediu uma sala para uma reunião privada com uma visita inesperada. Apesar de se apresentar como Jenlen, Steven e Ragel a reconheceram como Alusair Nacacia Obarskyr, a filha mais nova do Rei Azoun IV de Cormyr e da Rainha Filfaeril.

As fofocas que chegaram até Deepingdale no ano passado davam conta de que, no começo da primavera, logo depois que a família real anunciou seu noivado com um jovem da família Wyvernspur, de Immersea, a jovem Alusair fugiu de casa.

Extra-oficialmente sabe-se que o Rei ofereceu uma recompensa impressionante por seu retorno seguro: 12.000 peças de ouro e o título de cavaleiro.

As últimas notícias sobre isso são de dois meses atrás. Dizem que ela foi vista em Tilverton, uma cidade independente nas fronteiras ao norte de Cormyr que estava enfrentando um cerco de uma horda de orcs e goblins.

Um exército de Cormyr foi enviado para ocupar o Vale de Tilver – seu objetivo exato não é claro, mas há houve rumores de que seu objetivo principal era realmente trazer de volta a princesa renegada em vez de salvar a cidade. No começo deste mês eles massacraram os orcs e ocuparam o vale, e Cormyr anexou a cidade.

Alusair, percebendo que os sacerdotes a haviam reconhecido, pede que mantenham segredo sobre sua real identidade. Mas antes que pudessem sequer pensar sobre os motivos por trás de tal subterfúgio, ouvem uma comoção no pátio de entrada.

Ghevont Sevhonkian, o dono de uma das fazenda nas redondezas, corria para dentro da templo carregando nos braços Avor, um de seus filhos adolescentes. O garoto havia saído para caçar com o irmão mais novo e voltou sozinho, ardendo em febre, se arrastando, com um vapor negro saindo da boca e espinhos negros espalhados pelo corpo. Inspecionando mais atentamente percebe-se que não são espinhos, e sim pequenos chifres que estão brotando em seu corpo. Sunlar, o alto-sacerdote de Mystra, aponta que o jovem estava acometido de alguma maldição mágica, e Ragel corre para trazer um pergaminho com a prece necessária para curar Avor.

Recuperado, o jovem conta que ele Misak, seu irmão mais novo, foram caçar perto de umas ruínas na floresta. Quando estavam lá um homem apareceu de uma hora para outra, coberto de sangue e segurando alguma coisa metálica em suas mãos. Quando tentaram o acudir o objeto brilhou com uma aura negra e ele começou a sentir sua pele arder. Saiu correndo desesperado, agoniado por deixar o irmão para trás. Ainda conseguiu ver o estranho se esgueirando para uma abertura em uma das ruínas.

Seguindo para as ruínas os clérigos de Mystra encontram o corpo do irmão mais novo trespassado por chifres, mas tomado de uma energia negra que o faz se mover mesmo em morte. Nada resta a não ser aplicar a misericórdia de Mystra e levar o corpo para que pudesse ter um funeral digno.

Intrigados com os acontecimentos, descem pela fenda nas ruínas e encontram indícios de que originalmente aquele complexo era um pequeno templo dedicado a Myrkul, o deus da morte.

O teto estava completamente coberto de insetos horríveis – besouros, lacraias e mariposas escuras. Eles se moviam constantemente, e apenas um leve crepitar podia ser ouvido ecoando pela câmara.

A sala em si era dividida em câmaras menores separadas por muretas baixas. Agora tomadas de destroços, alguns bancos de madeira petrificada ainda sobravam em algumas das câmaras. Em alguns dos bancos podiam ser vistos riscos feitos com algum objeto pontiagudo formando caveiras.

Dezenas de corpos, alguns apenas um punhado de ossos empoeirados, podiam ser vistos entre os escombros. Outros pareciam mais frescos, como se tivessem morrido há poucas semanas. Os dois mais frescos, com vermes brotando das entranhas, ainda trajavam o que poderia ser descrito como “roupas de aventureiros”, com suas mochilas e armas caídas junto aos corpos.

Uma runa arcana trancava grandes portões de bronze que deviam levar até a nave principal do templo. Em algum lugar do complexo runas correspondentes deveriam ser ativadas para destrancar a passagem, mas antes que pudessem explorar mais os cadáveres, agora transformados em guardiões, se levantam dos escombros para proteger os segredos de Myrkul.

Depois de darem cabo nos esqueletos, seguem para a câmara da direita. Vários sarcófagos simples, construídos de uma pedra arenosa, estavam espalhados ao redor desta câmara. Em uma plataforma elevada um sarcófago maior está parcialmente aberto, e uma luz bruxuleante podia ser vista dentro dele. Um espírito sai do sarcófago e exige o sacrifício do poder de Mystra para revelar seus segredos, e quando Steven canaliza o poder de sua deusa a aparição se mostra satisfeita, revelando a primeira runa que procuravam.

Seguindo para a passagem da esquerda, encontram mais sarcófagos. Poças de um líquido viscoso e rubro parecem ter vazado de alguns deles. Uma análise mais cuidadosa revela que não é sangue, a natureza da substância um mistério.

Na parede oeste uma gravura em alto relevo de um cemitério. A imagem é solene e calma, mas ao olhar para ela é impossível não imaginar que algumas das tumbas esperam por seus habitantes. Thommus quase é sugado para dentro da gravura, mas resiste ao chamado sedutor e consegue encontrar a segunda runa.

Com os portões de bronze abertos, avançam para a nave principal do templo. Três sarcófagos ornamentados repousavam em palanques elevados ao redor da sala, sendo que o do meio estava mais elevado que os outros e possuía ornamentos mais rebuscados.

Duas tochas ao longo das paredes laterais enchiam a sala com luz púrpura, revelando alcovas abertas ao longo das paredes leste e oeste. No centro da sala, um mosaico no chão, feito do que pareciam ser pequenos pedacinhos de ossos, formava o símbolo de Myrkul.

Um estranho homem trajando vestes sujas e rasgadas estava ajoelhado sobre um mosaico, oferecendo o que parecia ser um fragmento de metal para o alto. Estudando o fragmento conseguiram deduzir que era um pedaço de uma coroa de ferro ornamentada com chifres.

Antes que pudessem tomar alguma outra ação, escutaram o som de uma moeda caindo no chão e rolando em sua direção. Uma grande figura encapuzada meio translúcida portando uma afiada foice surgiu na câmara, que foi tomada por um clima opressivo e um frio sobrenatural.

O avatar de Myrkul fez um gesto com a mão e o fragmento da coroa vôou em sua direção.

“Maldita genasi. Malditos aventureiros”, ele disse. “Sua deusa sorriu para vocês hoje, não tenho tempo para lidar com vocês pessoalmente.”

Balançando a foice fez com que o corpo de seu sacerdote se levantasse como um morto-vivos, e sombras surgissem dos sarcófagos enquanto ele mesmo desaparece.

Dando cabo dos mortos-vivos, os clérigos levam o corpo de Misak de volta para o fazendeiro, que agradece efusivamente. Caladnei e Alusair já haviam ido embora, mas algo dizia que não seria a última vez que se encontrariam.

Pesquisando sobre o entranho fragmento de coroa, chegaram a conclusão que se tratava da Coroa de Chifres. Criada por um arquimago de Netheril chamado Trebbe, o fundador do enclave voador de Shadowtop Borough. Em -2237 DR, enquanto trabalhava na Coroa, ela explodiu matando Trebbe e destruindo um bairro do enclave. A coroa em si não foi destruída, mas acabou se perdendo.

Em -1423 DR a Coroa foi vista novamente, desta vez nas mãos do arquimago Requiar. Ele a usou para matar outros 30 arquimagos e conquistar Shadowtop Borough. O artefato deixou Requiar enlouquecido e eventualmente incapacitado. Depois que o insensato arcanista foi deposto, seus assassinos procuraram a Coroa mas, apesar de poderosas adivinhações e uma busca minuciosa pela cidade, e além dos muitos grupos de aventureiros que vasculharam a Floresta Oriental nos 150 anos seguintes, eles nunca conseguiram encontrá-la.

Em -644 RD a Coroa foi finalmente redescoberta pelo arquimago Shadelorn. Ele estava trabalhando em um projeto para ter sucesso onde Ioulaum falhou na criação de um mythallar aprimorado. Em -342 DR outra arquimaga, Shenandra, estava trabalhando ao mesmo tempo para combater a magia dos phaerimm capaz de sugar a força vital. Por infortúnio, os dois concluíram com sucesso seus projetos exatamente no mesmo período no Shadowtop Borough. A Coroa, querendo se vingar da cidade por sua derrota anterior, estava imperceptivelmente corrompendo o trabalho de Shadelorn e, quando ele ativou seu novo mythallar, drenou toda a magia e feitiços memorizados de tudo e de todos em um raio de 32 quilômetros. O enclave caiu, seus habitantes morreram, a ameaça dos phaerimm persistiu e a única coisa que sobreviveu intacta foi a coroa.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *