Interlúdio: Se entrassem certo dia em meu covil (parte 1)

“Danos menores causados por um dragão pouco digno de nota”, disse Byphast Morte Gelada. Ela parecia, para todos os sentidos, uma elfa, exceto que seu cabelo refletia a luz em tons de prata ao invés do habitual dourado ou preto, e sua pele parecia um pouco esbranquiçada. Seus olhos também não eram o que se esperava, pois brilhavam com uma luminosidade amarela, com uma linha negra ao seu redor, como os olhos de uma serpente. “Palishchuk ainda se encontra no mesmo estado desde a primeira invasão, anos atrás.”

Na câmara havia mais uma pessoa, sentada em uma pequena mesa diante de um trio de grandes estantes. A figura girou a cabeça lentamente na direção de Byphast. O tecido de sua capa cinza estava rasgado em tiras, revelando a escuridão aveludada do manto abaixo. As mangas volumosas pendiam abaixo da borda da mesa, mas quando o homem se virou seus dedos ficaram a mostra.

Dedos de osso. Um esqueleto vivo.

Embaixo do grande capuz do manto havia apenas escuridão, e Byphast estava feliz por isso.

Seu alívio não perdurou, entretanto, pois Zhengyi levantou uma de suas mãos esqueléticas e puxou o capuz para trás. O crânio cinzento e branco se revelou. Os pedaços de carne podre e seus olhos inumanos e sobrenaturais – pontos de fogo vermelho-amarelados – forçaram Byphast a desviar o olhar. E o fedor, a essência da própria morte, quase a forçaram para fora da sala.

Zhengyi puxou o capuz completamente para trás para revelar as manchas de seu cabelo branco, emplastados em todos os ângulos em seu crânio. Se a maioria das pessoas se arrumavam para parecer mais atraentes, parecia bastante evidente que Zhengyi fazia o oposto.

Porque, assim como a maioria das pessoas, como a maioria das criaturas, amavam a vida, Zhengyi deleitava-se com a morte. Ele havia passado para além da sua forma humana para um estado de não-vida. Das muitas variantes entre os mortos-vivos de Toril, nenhum conseguia ser mais repugnante e revoltante que um lich. Um vampiro sabia ser charmoso, bonito até, mas um lich não era uma criatura de sutilezas. Um lich não fez um pacto com a morte, como um vampiro. Um lich não era um participante involuntário do estado de morto-vivo, como eram os esqueletos, zumbis e fantasmas. O estado de um lich era proposital, um mago que por encantamentos poderosos e pura força de vontade tinha derrotado a própria morte, recusando-se a render sua consciência e sua existência a um ser divino.

Mesmo Byphast Morte Gelada, o maior dragão branco da Grande Geleira, mexeu-se desconfortavelmente na presença de Zhengyi. Ela desejou que os corredores do Castelo Perilous fossem mais amplos e altos para que ela pudesse enfrentar Zhengyi em sua forma de dragão.

Realisticamente, porém, Byphast não acreditava que o lich ficaria impressionado com aquilo. Certamente Zhengyi não tinha mostrado nenhum medo quando ele atravessou os corredores gelados do covil de Byphast para confrontá-la em sua câmara do tesouro. Ele tinha passado através do fosso das remorhaz, onde vários dos poderosos vermes polares, asseclas do dragão branco, montavam guarda. Ele havia dominado os trolls de gelo que Byphast usava como sentinelas de tal forma que eles não foram capazes de advertir sua divindade dracônica da chegada de Zhengyi.

“Diga-me, Byphast, que danos permanentes poderiam sua própria baforada mortal ter causado na pedra de Palishchuk?”, o lich respondeu finalmente.

Os olhos de réptil do Byphast se estreitaram. Sua baforada era de gelo, é claro, poderosa o suficiente para congelar a carne e o sangue de inimigos vivos, mas em grande parte ineficazes contra pedra.

Ou contra um lich.

“A saliva de um dragão negro é concentrada,” Byphast respondeu, seus dentes cerrados. Ela sentiu sua raiva latejar através de sua forma de elfo, gritando para que ela revertesse ao seu estado natural. “Os dragões negros podem causar devastação, é verdade, mas em uma área menor. O sopro de um dragão branco alcança áreas amplas e é mortal mesmo nos limites de seu alcance. E mais eficaz. Eu posso matar todos dentro sem destruir a própria cidade. As pessoas morrem, os edifícios permanecem. Qual é a escolha mais sábia, Rei Bruxo?”

“Você sabe que sou simpático a você”, respondeu Zhengyi, os pedaços de pele seca nos cantos de sua boca de alguma forma transformando-se em um sorriso congelado.

Byphast escondeu seu desgosto. “E eu possuo magias potentes, muito além das habilidades de Urshula, estou certa.”

“Você não gostaria dele como um aliado?”

Byphast demostrou surpresa.

“Ele já havia saído há alguns anos”, Zhengyi continuou, deixando de lado a pergunta. “Isso é bom. Ele está abaixo do lago ao norte da cidade – disso estou certo”.

“Quando Zhengyi deseja encontrar um dragão…” Byphast murmurou.

“Vou conquistar a Damara, minha amiga. Os despojos serão grandes, e meus aliados dragões serão bem recompensados.”

Os olhos de Byphast se estreitaram novamente, e com a luz da ganância brilhando por trás deles.

“Você não acha Urshula digno de nossa guerra?”, perguntou o lich.

“Urshula é o pai de todos os dragões negros nas terras de Bloodstone”, Byphast respondeu. “Recrute-o e você tem a certeza de uma revoada de dragões negros ao seu serviço. Eles são mais eficazes para enfraquecer as paredes de um castelo antes do avanço de sua infantaria”.

“Oh, vou recrutá-lo,” Zhengyi prometeu. “Lembre-se, eu tenho o maior tesouro de todos.”

Os olhos de Byphast estreitaram-se mais uma vez.

Ele tinha, de fato.

“Urshula não é possuidor de um repertório mágico?”, perguntou Zhengyi. Ele bateu um dedo esquelético no osso onde o lábio costumava estar, e voltou para sua pequena mesa e para a bola de cristal sobre ela.

“Ele é um dragão negro”.

“E você é um dragão branco,” Zhengyi respondeu, olhando para trás. “Quando pela primeira vez eu ouvi falar de Byphast, eu fiz a mesma pergunta para Honoringast o Vermelho”.

Os olhos de Byphast estreitaram-se com a menção ao poderoso dragão vermelho, o maior dos aliados de Zhengyi. Poucas criaturas em todo o mundo deixavam Byphast revoltada tão completamente quanto um dragão vermelho, mas ela não era tola o suficiente para testar a sua força e astúcia contra Honoringast, que era poderoso, mesmo quando comparado com seus parentes escarlates. E os dragões vermelhos eram os mais formidáveis de todos, salvo os felizmente evasivos, raros e altivos dragões dourados.

“‘Ela é um branco’, foi sua resposta, em um tom nada menos desdenhoso do que o seu próprio,” Zhengyi continuou. “E, no entanto, para meu grande prazer e maior ganho, eu aprendi mais tarde que você era bastante habilidosa na Arte.”

“Em todos os meus séculos, eu não ouvi falar de Urshula ter usando um feitiço sequer de qualquer consequência”, Byphast respondeu. “Eu encontrei-o apenas uma vez, na base da Grande Geleira, e como tínhamos ambos acabado de devorar cada um uma vila inteira, não nos enfrentamos.”

“Você teve medo dele?”

“Mesmo o mais fraco dos dragões é capaz de infligir grandes danos, Rei Bruxo. É um fato que você faria por bem em lembrar”.

A risada de Zhengyi soou mais como um chiado.

“Devo acompanhá-lo para visitar Urshula?” Byphast perguntou enquanto o Rei Bruxo sentou-se de frente para a bola de cristal e tirou a capa de seus ombros. Byphast não tinha muita certeza da razão pela qual ele estava fazendo isso. Era seu entendimento de que eles estavam prestes a viajar para o covil de Urshula imediatamente. “Ou você está convocando Honoringast? Certamente sua chegada com um vermelho e um branco ao seu lado vai intimidar Urshula mais plenamente. ”

“Eu não vou precisar de Honoringast, nem mesmo de Byphast”, explicou Zhengyi. “Se Urshula não é sábio o suficiente para entender o poder da Arte, não seria sensato se aventurar em seu covil”.

“Se ele não tem magias então ele não é tão formidável quanto eu”, Byphast rosnou.

“É verdade, mas você não acabou de me alertar sobre o mais fraco dos dragões?”

“No entanto, você não tem medo de mim?”

Zhengyi olhou para ela, e Byphast percebeu quão ridícula ela deve ter parecido naquele momento, com os braços cruzados sobre o peito.

“Eu não temi você porque sabia que você entenderia o valor daquilo que eu tinha para oferecer”, explicou o lich. “Byphast, sábia o suficiente para conjurar as magias mais poderosas, foi, naturalmente, sábia o suficiente para reconhecer o maior tesouro de todos. E mesmo se você se tivesse recusado minha oferta, você não teria sido tola o suficiente para desafiar o meu poder naquele lugar e naquele momento”.

“Você presume muito.”

“A arte exige disciplina. Se Urshula não tem essa disciplina, então é melhor que eu o aborde de uma forma onde a sua impetuosidade não possa causar nenhum dano.”

Zhengyi se inclinou sobre a mesa e olhou para a bola de cristal. Ele acenou com uma das mãos sobre ela, e uma espiral turva de névoa cinza-azulada apareceu em seu interior. Um momento depois, o Rei Bruxo acenou com a cabeça e deslizou sua cadeira para trás. Ele levantou-se, enfiou a mão no bolso de seu manto, e revelou uma pequena ametista, moldada na forma do crânio de um dragão.

Byphast prendeu a respiração; ela conhecia muito bem uma pedra preciosa bastante semelhante.

“Você localizou Urshula?”

“Precisamente onde eu disse que seria”, respondeu Zhengyi. “Numa toca na turfa ao lado do lago.”

“Você vai encontrá-lo sem mim?”

“Rogo para que observe”, Zhengyi respondeu. “Você estará lá em espírito, pelo menos.”

Ele começou então a agitar os braços lentamente diante dele, as largas mangas de suas vestes ondulando hipnoticamente como um par de serpentes. Ele entoou um cântico, conjurando os componentes verbais de um feitiço.

Byphast conhecia aquele feitiço, e ela observou com interesse enquanto Zhengyi começou a se transformar. Pele cresceu ao longo dos ossos de seus dedos das mãos e da sua face. Cabelo brotou de todos os remendos em seu crânio, não mais brancos como os aglomerados que já adornavam a cabeça, mas de um marrom rico e brilhante. Os cabelos brancos também começaram a escurecer. As vestes expandiam conforme Zhengyi crescia e ganhava corpo, e seu sorriso branco desapareceu sob cheios lábios vermelhos.

Ele parecia como tinha sido em vida, robusto e rotundo. Uma barba escura brotou de seu queixo e bochechas.

“Menos chocante, você não acha?”, perguntou.

“Urshula iria tentar comê-lo em qualquer forma, tenho certeza.”

A risada de Zhengyi soou tão diferente do seu chiado anterior como sua forma redonda e carnuda parecia diferente de seu corpo esquelético. A risada ressoava de sua barriga e repercutia profundamente na garganta grossa do homem.

“Você não deveria ter esperado até que você estivesse perto do covil?”, perguntou o dragão.

“Perto? Estou praticamente dentro mesmo enquanto falamos!”

Byphast ficou ao seu lado enquanto ele virou-se para a bola de cristal e começou a lançar outra magia. Olhando para a bola, o dragão podia ver Urshula, a Besta do Pântano, enrolado em sua toca subterrânea sobre uma pilha de tesouro. Ela não podia dizer se era um truque da bola iluminando as paredes de pedra suja da câmara, ou se havia algum líquen fosforescente ou outra fonte de luz dentro da casa de Urshula.

Mas isso não importava, pois Byphast sabia que aquilo não era uma ilusão. A imagem na bola de cristal era realmente a de Urshula e era em tempo real. Byphast voltou-se para Zhengyi assim que ele completou sua magia.

Seu grande corpo brilhou por apenas um piscar de olhos, e em seguida o brilho libertou-se de sua forma física e avançou, uma imagem brilhante e translúcida que lembrava o homem que estava por trás dela. Ela encolheu como se tivesse percorrido uma grande distância, movendo-se em direção à bola de cristal e desaparecendo dentro do vidro.

Urshula abriu um olho sonolento, e seu olhar iluminou uma área cônica à sua frente. Como um holofote, seu olho escrutinava a caverna. Pedras preciosas e ouro brilhavam a medida que seu olho deslizava através das sombras. O segundo olho do dragão se abriu, e sua grande cabeça se levantou quando seu olhar identificou um homem corpulento e barbudo, trajado em vestes de veludo preto.

“Saudações, poderoso Urshula”, disse o homem.

Urshula cuspiu nele, e o chão em torno do homem borbulhou e estalou. Uma pilha de ouro se derreteu em uma única pepita, e uma armadura de metal mostrou suas limitações, seu peitoral se desintegrando sob o sopro de ácido do dragão negro.

“Impressionante”, disse o homem, olhando ao seu redor. Ele saiu ileso, intocado, como se o ácido tivesse passado através dele.

Urshula estreitou os olhos de réptil e examinou o homem – a imagem de um homem na verdade – mais de perto. O dragão sentiu a magia e um rosnado baixo escapou através de suas longas presas.

“Eu não vim para roubar de você, poderoso Urshula. Nem para atacá-lo de qualquer forma. Talvez você tenha ouvido falar de mim. Sou Zhengyi, o Rei Bruxo da Vaasa”.

O tom de voz disse ao dragão que o pequeno homem tinha uma opinião muito positiva de si próprio. Típico.

“Ah, entendo”, continuou o homem. “Minha reivindicação de realeza significa pouco para você, sem dúvida, pois você me considera como um daqueles que detém direitos apenas sobre seres humanos. Ou, talvez, sobre os humanos, elfos, anões, orcs, goblins, e todo o resto das raças humanoides em que você tem pouco interesse, exceto para fazer uma refeição deles de vez em quando.”

O dragão aumentou o volume de seu grunhido.

“Mas você deve tomar nota desta vez, Urshula, pois minha ascensão detém grandes implicações para todos os que chamam a Vaasa, ou qualquer lugar nas Terras do Bloodstone, sua casa. Eu unifiquei todas as criaturas da Vaasa para batalhar contra os senhores débeis e fracos da Damara. Os meus exércitos avançam para o sul através das Galenas, e logo toda a terra será minha.”

“Todas as criaturas?” Urshula respondeu com uma voz que era tanto um assobio e um chocalho ao mesmo tempo.

“A maior parte, sim.”

O dragão rosnou.

“Eu não sou nenhum tolo”, disse Zhengyi. “Naturalmente eu não abordaria alguém tão magnífico como você até que eu estivesse certo de que os meus planos iriam prosseguir. Eu não iria alistar Urshula, a Besta do Pântano, para travar as batalhas iniciais, pois não seria digno de uma criatura como Urshula até que as primeiras vitórias foram alcançadas”.

“Você é um tolo se você mesmo assim acha-se digno.”

“Outros não concordam.”

“Outros? Goblins e anões?” O dragão bufou pequenas baforadas de fumaça negra estalando por suas narinas.

“Você já ouviu falar de Byphast Morte Gelada?”, perguntou Zhengyi. As narinas do dragão se alargaram, e seus olhos se arregalaram. “Ou de Honoringast o Vermelho?”

A cabeça de Urshula recuou com a menção daquele último. O dragão preto, repentinamente não tão seguro de si, olhou ao redor.

“Eu sou agora digno?”, perguntou Zhengyi.

Urshula levantou-se. O movimento, assustadoramente rápido e gracioso para tão grande besta, fez Zhengyi recuar apesar do fato de que ele era apenas uma imagem projetada, sua forma física longe da respiração e da mordida do ancião negro.

“Se você é digno, então você é digno de nada a não ser o título de tolo, e nada mais, por ter perturbado o descanso da Urshula!” o dragão rugiu. “Você encontrou minha casa e se considera inteligente, mas cuidado, ‘Rei Bruxo’, pois ninguém que conhece a casa de Urshula vive por muito tempo.”

O trovão do seu rugido ainda estava reverberando nas paredes da caverna quando o dragão veio para a frente. Suas mandíbulas se abriram e fecharam ao redor da imagem projetada de Zhengyi. Os dentes do grande dragão se fecharam violentamente onde os joelhos do lich haviam aparecido. Urshula mordeu apenas ar insubstancial, é claro, pois Zhengyi não estava realmente na caverna, mas o dragão se debateu e atacou de qualquer maneira, suas patas dianteiras rasgando para baixo na direção do que a sua boca não tinha mordido. E quando aquelas garras de dragão passaram pela imagem insubstancial de Zhengyi e bateram no chão, Urshula flexionou seus grandes músculos e cravou suas unhas fortes como ferro na pedra, cavando sulcos profundos.

O dragão finalizou abrindo suas asas amplas e agachando-se sobre as patas traseiras, com o olhar fixo na imagem do Rei Bruxo.

“Os outros dragões notáveis da região juntaram-se a mim”, Zhengyi prosseguiu, imperturbável e aparentemente sem ter se impressionado. “Eles reconhecem o valor e as vantagens desta campanha vencedora. Quando todas as Terras de Bloodstone estiverem sob meu comando, eles serão bem recompensados.”

“Urshula não precisa de outros para recompensá-lo,” o dragão respondeu. “Urshula leva o que Urshula quer.”

“Eles encontraram a segurança em minhas fileiras, poderoso dragão.”

“Urshula mata quem ameaça Urshula.”

“Você está ciente do bando de heróis ganhando força em terras do oeste?”, perguntou Zhengyi. “Você já ouviu falar da Companhia do Milagre?”

O dragão bufou.

“Você conhece seus feitos, é claro?”

“Você me confundiu com alguém que se importa, parece.”

“Nveryiothrykrazz”, Zhengyi respondeu. “O terrível dragão negro que ameaçava subjugar toda a Costa da Espada foi derrotado por eles. Seriam eles amigáveis com Urshula se de alguma forma eles conseguissem me derrotar?”

“Você acabou de reivindicar a liderança de uma campanha vencedora,” o dragão lembrou.

“De fato, e é em grande parte por causa da sabedoria de Byphast, Honoringast, e outros que vêem a escolha com clareza.”

“Então por que você veio perturbar meu sono? Vá e ganhe, mas deixar Urshula em paz. E considere-se com sorte pois poucos deixam a presença de Urshula exceto espalhados em pilhas de excrementos.”

“Magnanimidade?” Zhengyi perguntou tanto quanto afirmou. “Ofereço aos dragões recompensas em troca da sua assistência. Eu seria negligente se eu não estendesse a cortesia para Kazmil-urshula-kelloakizilian.”

O dragão riu, um som de pedras sendo esmagadas em uma poça de ácido, e disse: “Você se vê como a salvação, então, como o futuro rei de tudo que você avista. Tenho sobrevivido a muitos desses tolos. Você se vê como alguém digno de nota, mas eu vejo um ser humano patético, e para piorar um humano morto, vestindo nada mais que o disfarce da vida. Desista, lich. Procure o seu reino e a paz em um mundo mais condizente com a sua forma corporal apodrecida. Não me incomode mais, ou eu vou ter que derrotá-lo eu mesmo”.

“E se você vir contra mim, com ou sem seus companheiros dragões”, Urshula continuou, “então informe Byphast Morte Gelada que ela será a primeira a sentir a mordida da minha ira.”

“Você ainda não ouviu minha oferta, grande besta”, disse Zhengyi. Ele exibiu a pequena joia em forma de crânio de um dragão. “O maior tesouro de todos. Você reconhece isso, Urshula?”

O dragão estreitou os olhos e emitiu um rosnado baixo, mas não respondeu.

“Um filactério”, Zhengyi explicou. “Preparado para Urshula. Eu derrotei a Morte, poderoso dragão. E eu sei como você também pod…”

“Vá embora daqui abominação!” o dragão rugiu. “Você abraçou a morte, e não a derrotou, e você só fez isso porque você é da raça inferior, de vida curta e acometida de enfermidades. Você presume a morte de Urshula, mas Urshula é mais velho do que as mais antigas memórias de sua raça. E Urshula permanecerá quando a memória de vocês se desvanecer de todo o mundo!”

A imagem fechou sua mão e escondeu a gema. “Você não aprecia o seu valor”, disse Zhengyi, dando de ombros e fazendo uma reverência. “Durma bem, poderoso dragão. Você é tão impressionante como me foi dito que você seria. Talvez outro dia…”

“Eu nunca vou vê-lo novamente, a não ser para te ver destruído.”

As palavras de Urshula ecoaram e reverberaram, e pareceram desfazer as imagem de Zhengyi.

O dragão negro permaneceu agachado por algum tempo, imóvel como uma estátua, para ouvir qualquer indicação de que Zhengyi ou seus asseclas estavam dentro da câmara ou dos corredores além.

Muitas horas depois, o grande preto se enrolou e voltou a dormir.

(Traduzido e adaptado do conto “If Ever They Happened Upon My Lair”, de RA Salvatore)

Interlúdio: Se entrassem certo dia em meu covil (parte 2)

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